Tuesday, November 27, 2007

Reflexão XLIX (a ideologia)

O Poeta, todo mundo sabe, é anarquista.
E está cansado de ter que explicar a ideologia:
Fim dos governos, o maior sonho humanista.
A organização horizontal, sem hierarquia.

Anarquia não é sinônimo de confusão como se crê.
O rebanho acostumado a ser conduzido é que não vê
Que o “Estado” de Hobbes não protege o cidadão,
E a “Soberania” do tratado de Westphalia é ficção.

O Estado, a história conta, produziu barbárie e tragédia.
O universo virtual é um bom exemplo de anarquia:
O conhecimento compartilhado construiu a wikipédia.

Conceitos “atualíssimos” são antigos ideais da anarquia:
Liberdade sexual, auto-ajuda, defesa dos animais e da natureza.
O mutualismo, diferente do comunismo, e que não gera pobreza.

Monday, November 26, 2007

Reflexão XLVIII (o vento forte)

O vento forte que balança o coqueiro,
É uma emoção irresistível e desfolhante.
Reanima o coração e deixa o olho brilhante.
Muito parecida com o grande amor primeiro.

Sentimento tardio, resquício de paixão.
Que deixa a alma marcada e saudosa.
Mistura os sentimentos num turbilhão.
Quando declarado, deixa a musa curiosa.

O vento forte faz pressão, insiste e passa.
Mas não sem deixar seu toque de magia.
Uma certa substância invisível que enlaça

Poderoso e dominador como o porre de cachaça.
Mas, depois, a ressaca é um sentimento de alegria
De saber-se vivo, de alma lavada e achando graça.

Thursday, November 22, 2007

Reflexão XLVII (ônibus)

O Poeta, todo mundo sabe, viaja de ônibus.
Sem opção, não é o transporte que o seduz.
Viaja em pé, apertado e sendo sacudido.
Agüenta solavanco, mau hálito e sovaco fedido.

Sentado ao lado de gente cheirando a cigarro.
Faz anos que não consegue comprar um carro.
Educado, cede seu lugar às pessoas mais idosas.
Raramente aparecem mulheres bonitas ou gostosas.

O motorista que conduz parece o governo de estado.
Serve a um senhor invisível e trata o povo como gado.
Descarrega sua raiva nos passageiros, o infeliz...

É duro esperar sob chuva e sol feito um estafeta
Só na Colômbia o cara que espera deve ser feliz
Lá, o ponto de ônibus, é “paradero de busseta”.

Monday, November 19, 2007

Reflexão XLVI (a dieta do poeta)

Se você fuma, ora, deixe de fumar.
Se bebe, beba. Mas com moderação.
Sexo é bom e faz muito bem ao coração.
Não pare, estique as pernas, vá caminhar.

Aos alimentos naturais dê preferência.
E pode comer sem arrependimentos.
Beba bastante água e evite condimentos.
É simples, não requer muita ciência.

Não se deve exagerar também na dieta.
Uma escapadinha não dói na consciência.
No sábado pode vir a feijoada completa.

Uma boa caipirinha e a cerveja predileta.
Na segunda-feira assuma a conseqüência:
Atitude. Regime. Não faça curva na reta.

Wednesday, November 14, 2007

Reflexão XLV (água)

A água que a minha sede sacia
Sem ela nada no mundo existe
Três estados mais a melancia
Tudo em perfeito ciclo persiste.

Toda a natureza utiliza essa via
Dois átomos de hidrogênio
Ligados a um de oxigênio
Fórmula simples que a vida cria.

Predizem que a água vai acabar.
Eu acho que o assunto é outro
Querem é o consumo onerar...

Justificam que custa muito tratar
Que água potável é igual a ouro
Querem mais é o líquido privatizar.

Monday, November 12, 2007

Reflexão XLIV (os amigos)

(I know I’ll often stop and think about them.)

Lembro frequentemente dos meus amigos. Gente que fez diferença na minha vida. Alguns famosos, outros mortais como eu. Pessoas abençoadas com talento especial ou simplesmente pessoas comuns e amigas. Lembro, com saudade, do Ermelindo Fiaminghi recolhendo flores de um pé de manjericão só para preparar um macarrão especial para o nosso almoço num domingo no atelier dele. Lembro do Amílcar de Castro recordando efusivamente de mim, feliz, quando pedi um autógrafo no catálogo de esculturas dele. Uma vez fui repreendido pelo Manabu Mabe por estar bebendo um uísque atrás do outro no seu vernissage e nesse dia conheci a Bruna Lombardi que me deu um beijo que jamais vou esquecer. Fiquei tão pertinho daqueles olhos verdes... Fui “valete” de Tomie Otake numa exposição no MAM. Lothar Charoux gostava das cores que eu usava. Fui elogiado por Ernesto Piva. Mario Chamie escreveu exaltando a minha pintura e até hoje pergunta de mim aos amigos. Aldemir Martins gostava das minhas visitas. Fui aluno de Joseph Louyten, hoje reitor numa universidade do Japão. Na USP, fui aluno do Antônio Cândido, do Luiz Tatit e do Martinho Lutero. Tive um relacionamento marcante com Joyce Cavalcante. Estudei no atelier do Paulo Acêncio, fui padrinho de casamento do Fernando Durão. Minha primeira publicação de poesia foi com Glauco Mattoso e Luiz Roberto Guedes. Fui colega de escola do Pascoal Ferreira da Conceição. Amigo de infância do Mário Garcia. Jorge Medauar sempre gostou dos meus textos e nossas reuniões eram sempre divertidas, falando da junventude dele descrita pelo Jorge Amado: “Medauar era o “ai jesus” das putas”. Juanribe Pagliarini fez a arte final do meu convite de casamento na agência de propaganda do Medauar. Hoje é escritor e não sei se lembra mais de mim. Comi pastéis de Santa Clara no apartamento da Wega Nery.
Lembro do Sonekka pedindo licença pra tocar violão no meu bar e acabamos parceiros em Remédio Inútil, com o querido Zé Edu. O pessoal do Clube Caiubi. O pessoal de Santos, Schmidt, Cajé, Nando Lee, músico de primeira, parceiro e companheirão de horas de conversa lá em casa, que ofereceu o almoço quando conheci a Lis Rodrigues que, sem saber, me fez lembrar do vento forte que balança o coqueiro. Através do Nando, conheci Zé Rodrix, na casa dele, quando me identifiquei como irmão na pedra e ganhei seus dois primeiros livros. Lá conheci também o Tavito.
Glauco me apresentou o Augusto de Campos, o Arnaldo Antunes, a Leila Míccolis, o Paranaguá e o Edílson.
Tantos outros amigos que a gente não esquece, mesmo quando não lembra. Lembro da Lígia e do desespero de amor que vivi com ela. O cheiro e o toque da pele dela ainda permanecem e são marcantes para mim. Pra sempre. E mais um dia.

“With lovers and friends i still can recall, some are dead and some are living. In my life I loved you more.”

Wednesday, November 07, 2007

Reflexão XLIII (a educação)

Fui educado a respeitar os bons princípios.
Ser honesto, trabalhador, sincero e leal,
Agir com integridade e sempre de forma legal.
Respeitar as pessoas e aceitar todos os ofícios.

Aprendi até a me conformar com os sacrifícios.
Passei a vida praticando isso no convívio social,
Esperando com fé que me trouxesse benefícios.
Mas com esta prática só me dei mal.

Recusei propinas e vantagens extralegais.
Passei por bobo, idealista e irracional.
Perdi promoções e aumentos salariais.

Perdi para outros mais espertos e venais.
Cheguei a ser discriminado por ser frugal.
Venceram os desonestos, os falsos, os desleais.

Monday, November 05, 2007

Reflexão XLII (inverno)

Meu pai dizia que o frio chegava a doer
Agasalhados, ele me levando pra escola.
Num distante passado, não posso esquecer
Doía as orelhas, as mãos, o nariz e a sola

O frio sempre me incomoda muito, atrapalha.
Tudo fica mais difícil: levantar, tomar banho
Vestir roupas pesadas, casaco de lã e malha
Pego gripe, coriza e acabo falando fanho.

Imagino aquele que vive no frio, coitado.
Graus abaixo de zero, uma friagem danada
Pra esse tipo de terra eu não fui moldado.

O bom do frio é o quente ar condicionado,
O conhaque e o corpo da mulher amada.
Debaixo das cobertas, uma lareira ao lado.

Thursday, November 01, 2007

Reflexão XLI (outono)

O Resfriamento da terra
O Sol oblíquo erra
O Ar puro condensa
Meu coração te pensa.

Vermelho outono desfolhado
O cheiro do solo molhado
Cobertor de folhas no chão
Época nem sim, nem não.

Tantos anos, tanta idade.
Nada se vive pela metade.

O futuro que seja sem guerra
Perto do mar. Ao pé da serra.