Friday, May 28, 2010

Telita

Eu abandonei minha filha diversas vezes. Separado da mãe dela, à noite, no final das visitas, ficava com ela na cama até que ela dormisse. Tinha 4 anos. Segurava com força minha mão numa pequena concha que fazia com suas mãozinhas enquanto sugava repetidamente a chupeta. Abria os olhos sonolentos de vez enquando para me ver. Sorria e depois fechava os olhos de novo. Eu lutava para não dormir antes dela. Depois de algum tempo, parava de sugar a chupeta, afrouxava as mãozinhas. Estava dormindo. Eu ficava algum tempo olhando ela dormir, depois, soltava a mão dela e, perguntando por que tinha que ser assim, saia devagar da cama. Encontrava a Estela na sala vendo TV, me despedia e ia embora. Só uma semana depois ficava sabendo que Telita, sentindo minha falta, tinha acordado e chorado, pedindo por mim...
Não sei, filha, em que recôndito da sua memória ficou isso. Mas até hoje sinto um aperto quando lembro de você pequenininha. A parte da sua vida em que eu não estava lá. A Estela dizia: “o que é que ela entende?...” Mas eu sentia que alguma coisa se passava em sua alminha de criança e me condeno por isso.

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